Memória e literatura infantil: a permanência das leituras da infância
Ana Carolina Carvalho

Nos anos 1980, Lia Zatz apresentou ao público infantil uma personagem inesquecível: Suriléa mãe-monstrinha. A história, publicada com ilustrações de Eva Furnari, conquistou leitores ao tratar com humor e ternura de temas muito próximos da vida familiar, como o ciúme entre irmãs, as disputas pela atenção da mãe, os desafios da maternidade. Quase quatro décadas depois, a Editora Peirópolis celebra esse clássico com uma nova edição, agora ilustrada por Rosinha, que reinventa a imagem da personagem e a aproxima de uma nova geração de leitores, mantendo a graça e pequenas pitadas de surrealismo, que ampliam o jogo entre o cotidiano e o inesperado.
Reeditar obras da infância não é apenas trazer de volta um livro esgotado. É reativar memórias, devolver ao presente uma parte importante da experiência leitora de uma geração. As histórias que conhecemos na infância permanecem conosco como marcas afetivas e culturais: são lembradas, recontadas, revisitadas. Muitas vezes, ao relermos esses livros já adultos, encontramos novas camadas de sentido, porque eles falam não apenas com as crianças, mas com quem fomos e com quem nos tornamos.
É por isso que determinados livros não se apagam. Eles atravessam décadas, ganham novas edições e formatos, acompanham mudanças gráficas e estéticas, mas permanecem vivos no imaginário coletivo. Foi assim com Marcelo, Marmelo, Martelo, de Ruth Rocha, que desde os anos 1970 segue encantando leitores; com O Menino Maluquinho, de Ziraldo, que há mais de quarenta anos se reinventa em edições, adaptações e leituras; ou ainda com obras que se tornaram clássicos universais, como O Pequeno Príncipe ou Alice no País das Maravilhas, que não cessam de ser traduzidas, relidas e reinterpretadas.
É nesse movimento que Suriléa retorna. Mas o seu caso é ainda mais especial: além de revisitar a mãe-monstrinha, agora também conhecemos Suriléa avó-monstrinha. A personagem cresceu, amadureceu, ganhou novas dimensões, como se seguisse os passos de seus leitores. Quem leu Suriléa nos anos 1980 hoje é adulto, talvez já pai ou mãe, alguns até avós. A literatura infantil, nesse sentido, revela uma de suas maiores forças: a de acompanhar o percurso da vida, permitindo que livros da memória sejam transmitidos a filhos e netos, criando um elo entre gerações.

Assim, a nova Suriléa chega com dupla vocação: é reencontro e descoberta. Para os que já a conheciam, é como rever uma amiga de infância, com a emoção de apresentá-la a uma nova geração. Para as crianças de hoje, é a chance de entrar em contato com uma personagem que atravessou o tempo e continua atual.
Reeditar clássicos da infância é, portanto, celebrar a permanência das leituras que nos acompanham por toda a vida. É reconhecer que certos personagens e histórias se tornam parte de nós e podem crescer conosco. Suriléa-mãe e avó-monstrinha são exatamente isso: prova viva de que a literatura infantil não envelhece, mas se reinventa, guardando a memória e abrindo espaço para o futuro.
Para os novos (e antigos) leitores:
Vamos conversar?
- Qual é a história mais antiga de que você se lembra de ter ouvido? Foi uma história contada de boca ou lida em um livro?
- Quem te contou ou leu com você essa história antiga?
- Você acha que a história de Suriléa mãe-monstrinha tem coisas parecidas com a sua vida? O quê?
- Você já quis que sua mãe ou outra pessoa que cuida de você tivesse mais do que dois braços, duas pernas e uma cabeça?
- O que você achou de a Suriléa ter virado avó? Imaginava que isso pudesse acontecer com uma personagem? Ficar mais velha, virar avó?
- Achou Suriléa engraçada? O que mais te divertiu nas histórias?
- Quando ilustrou a primeira edição de Suriléa, Eva Furnari resolveu desenhar um gato que acompanha as aventuras da personagem principal e suas duas filhas, Margarida e Violeta. Nesta nova edição, Rosinha mantém a presença de um felino (ou seria uma felina?), mas traz novidades. Você consegue descobrir que novidades são essas?
- Se fosse indicar os livros da Suriléa para algum amigo ou alguma amiga, o que você diria?

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