Entrevista com Lia Zatz e Rosinha – Suriléas mãe e avó
Quarenta anos se passaram desde que Suriléa, a mãe-monstrinha criada por Lia Zatz, conquistou leitores com seu humor afiado e sua sensível abordagem sobre os desafios da maternidade. Agora, ela retorna — e se transforma — na avó-monstrinha, renovando seus afetos e confusões familiares. Nesta conversa, a autora revisita o nascimento da personagem, inspirado em sua própria experiência como mãe, e comenta o reencontro com Suriléa na pele de avó. Já Rosinha, que ilustra as duas novas edições, compartilha as alegrias e os desafios de dar novos traços a uma figura tão marcante, anteriormente ilustrada por Eva Furnari, e fala da emoção de participar dessa trajetória afetiva e literária. A seguir, acompanhe essa troca generosa entre autora e ilustradora — e mergulhe no universo monstruosamente amoroso de Suriléa.
Entrevista com Lia Zatz
Peirópolis: Lia, a Suriléa foi um marco em sua carreira de escritora? Como é sua relação com essa personagem, que perdura no tempo?
Lia Zatz: Suriléa foi sim um marco. Foi meu primeiro livro, quando eu nem sonhava ainda em ser escritora. A ideia surgiu da minha vida com minhas duas filhas pequenas. Eu vivia uma rotina muito estressante, trabalhava fora, saía correndo do trabalho pra buscar as meninas na escola, quando chegava em casa era um tal de dar banho em uma, dar banho na outra, esquentar a comida, ler histórias, colocar pra dormir. E uma queria isso, a outra queria aquilo. Um dia, eu devia estar muito cansada porque dei um berro e falei: Eu não aguento mais, vocês precisam de duas mães, não é possível. Eu preciso ter duas cabeças, quatro braços, quatro…. Foi uma situação engraçada, elas deram risada e meu marido falou: “É uma boa ideia. Porque você não escreve uma história? Resumo da ópera: eu escrevi e pra minha surpresa o livro foi publicado e ganhou prêmio. Demorou um tempo ainda pra eu decidir sair do mercado e me dedicar a escrever livros infantis e juvenis. O livro ficou um tempo fora do mercado e algumas vezes encontrei jovens mães que lembravam muito dele e se ressentiam de não encontrar o livro para seus filhos. Que bom que agora ele renasce!
P: E escrever Suriléa, avó monstrinha, quarenta anos depois? Como foi essa experiência? O que se renovou? O que você reencontrou nesta nova Suriléa?
LZ: O Suriléa avó nasceu também da minha experiência como avó. Minhas duas filhas ficaram grávidas ao mesmo tempo! Sem combinar! E, eu confesso, virei uma futura avó e avó doidinha da silva. Acho que agora, com netos, que são quatro, já grandinhos, acalmei bastante. Claro que a avó da história que escrevi exagera, mas me identifico totalmente com ela.
P: Suriléa-mãe e Suriléa-avó ganharam os traços de Rosinha. No caso da Suriléa-mãe, ela havia sido representada pela Eva Furnari. Como foi acompanhar os novos rostos das personagens da primeira história? Você vê diálogos entre os trabalhos de Rosinha e Eva?
Amo o trabalho da Eva e amei o trabalho da Rosinha. São estilos completamente diferentes, mas vejo sim diálogo, no movimento, no transbordar do quadro ou da página, na criação de personagens que não estão na história escrita, como o gato que acompanha toda a narrativa e que, no caso da ilustração da Rosinha virou uma gata, que num determinado momento sai pela janela e volta com dois filhotes. Demais!
Entrevista com Rosinha Campos
Peirópolis: Rosinha, como foi ilustrar a reedição de Suriléa?
Rosinha Campos: Foi de friozinho na barriga a muito divertido.
Friozinho na barriga pela responsabilidade de ilustrar um livro que é um clássico e, principalmente, por ter sido ilustrado pela Eva, que pra mim, e para todos os ilustradores, é uma referência das mais importantes no cenário da literatura produzida para a infância.
E por ser uma história muito boa, que dá margem para a cabeça trabalhar com liberdade, me diverti demais da conta criando as ilustrações.
P: Você foi leitora de Suriléa? Tinha uma relação anterior com o livro?
RC: Sim!!! Ainda tenho a primeira edição de Suriléa em minha casa e guardo com muito carinho. Contei várias vezes para os meus filhos e sempre adorei esse livro.
P: Você tem uma relação antiga com a Eva Furnari, não é? Conta para a gente sua história com a Eva, e como recebeu o convite de “refazer” um trabalho dela?
RC: Sou arquiteta de formação e por muito tempo trabalhei na área. Adorava criar os projetos, mas lidar com os clientes, a prefeitura e a mão de obra, era muito difícil para mim. Essa constatação me deixou muito triste e chegou no momento do nascimento do meu terceiro filho, com a vida de cabeça para baixo. Detalhe: tive três filhos em 2 anos e 10 meses, quase trigêmeos. Quem é mãe entende, né Suriléa? Nessa época eu tinha acabado de fazer um curso teórico de literatura infantil e estava completamente apaixonada pela ilustração. Mas o sentimento era de que eu não seria feliz profissionalmente. Até que li na quarta capa de um livro da Eva que ela tinha feito arquitetura, tinha três filhos e que tinha iniciado a ilustrar depois de todo esse percurso. Naquele momento acendeu uma luz no final do túnel e meu coração se encheu de esperança.
Quase dois anos depois, assim que lancei meu primeiro livro, fui pela primeira vez na bienal em São Paulo, conheci uma livreira incrível, a Angela Aranha, e contei essa história para ela. No mesmo dia a Eva entrou no stand onde eu estava perguntando quem era Rosinha. Quando eu me virei e vi quem estava me procurando fiquei tão emocionada que caí no choro e quase não consegui dar uma palavra. Se eu já admirava a Eva, esse episódio potencializou meu respeito, afeto e admiração, que já eram imensos, por ela.
Ser convidada para ilustrar não só uma Suriléa, mas duas, foi um presente, me fez reviver esse momento com uma emoção e uma honra inimagináveis.
P: Livros e personagens clássicos costumam ser reeditados. Você se lembra de ilustrações marcantes de personagens clássicos que passaram por transformações ao longo do tempo? Você se inspirou em algumas delas para pensar seu trabalho com as Suriléas?
RC: Os contos de fadas são os clássicos mais reeditados que me vêm à cabeça nesse momento. A inspiração não foram outros livros, mas a experimentação. Passei semanas estudando várias alternativas. Não foi fácil pensar numa personagem que se diferenciasse e que fosse tão marcante quanto a Suriléa da Eva. Enquanto buscava as possibilidades a minha cabeça ficava desejando silenciosamente que a Lia, a Eva e a Renata gostassem e se divertissem com a nova versão da Suriléa, assim como os antigos e os novos leitores.
Sobre os livros
Suriléa-mãe-monstrinha
Lia Zatz
Ilustrações de Rosinha
20,5 x 27,5 cm • 48 páginas • 4 cores
ISBN 978-65-5931-420-1 • Livro digital ISBN 978-65-5931-422-5 (KPF) e 978-65-5931-421-8 (ePub)
Suriléa era uma mãe como muitas outras: cheia de amor, mas com apenas dois braços, uma cabeça e duas pernas — insuficientes, segundo suas filhas ciumentas, Violeta e Margarida. Cansada das brigas por atenção, Suriléa sonha em se transformar numa mãe-monstrinha, com membros duplicados para acolher igualmente as duas filhas. Mas será que isso resolveria tudo?
Quarenta anos depois de ter sido publicada, a história sensível e cheia de humor de Lia Zatz volta à cena com as divertidas ilustrações de Rosinha. E prova que segue atual e encantadora, fazendo rir e pensar sobre o cotidiano das crianças, os ciúmes entre irmãos e os múltiplos desafios e alegrias da maternidade.
Suriléa-avó-monstrinha
Lia Zatz
Ilustrações de Rosinha
20,5 x 27,5 cm • 48 páginas • 4 cores
ISBN 978-65-5931-423-2 • Livro digital ISBN 978-65-5931-425-6 (KPF) e 978-65-5931-424-9 (ePub)
O tempo passou, e Suriléa continua se transformando. Agora, ela é avó de Pepe Piloto e Maria Flor, que, como suas mães no passado, disputam o afeto e a atenção dessa avó nada comum e muito amorosa. Com humor e ternura, Suriléa- avó-monstrinha retoma a personagem marcante criada por Lia Zatz para abordar os afetos que atravessam as relações entre avós e netos — e nos fazer rir das confusões que cercam os cotidianos das famílias.
Sobre a autora e a ilustradora
Lia Zatz é autora de livros infantis e juvenis, vários deles premiados: ganhou duas vezes o Prêmio APCA de melhor autor de literatura infantil, foi finalista do Prêmio Jabuti e vários de seus livros receberam o selo Altamente Recomendável da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ). Estudou filosofia e ciência política, é fellow da Ashoka Empreendedores Sociais, onde desenvolveu projetos de incentivo à leitura, e sócia do Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas, onde desenvolveu projetos de democratização de informações. Também trabalhou como curadora de conteúdo, pesquisadora e redatora para o site Sustentáculos, sobre desenvolvimento sustentável, e para o site sobre o pensador Edgar Morin, que integra o portal do Sesc-SP.
Rosinha Campos é uma pernambucana que encontrou na literatura infantil e na ilustração o espaço para expressar sua arte e sua criatividade. Começou a desenhar ainda criança e, desde então, nunca mais parou. Estudou arquitetura e comunicação, trabalhou em agências de publicidade, foi diretora de arte em produtoras de vídeo e, em 1990, começou sua jornada na ilustração. Já ilustrou mais de cem livros, sendo autora de vários deles. Ganhadora de importantes prêmios, como o Jabuti, o Açorianos, o da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), entre outros, Rosinha também se dedica a oficinas para crianças e adultos, onde compartilha sua paixão por livros e artes visuais.
Add Comment